Lições poéticas
“Não quero amar,/Não quero ser amado./Não quero combater,/Não
quero ser soldado./– Quero a delícia de poder sentir as coisas mais
simples”, ensina-nos o poeta Manuel Bandeira em seu poema “Belo belo”,
publicado na obra Lira dos cinqüent’anos. A lição da singeleza, da beleza, contida na simplicidade.
Por meio do discurso desse notável poeta, sentimo-nos propensos a
refletir sobre a grandeza existente nas coisas singelas e sobre a forma
como elas conduzem nossos corações e nossas mentes ao caminho do que é
realmente importante para a existência humana. Possibilitar essa visão
apurada da vida contribui para o entendimento de que a felicidade é
composta pelas ações e pelas sensações presentes nas coisas mais
corriqueiras.
Esse aprendizado deve ser um dos primeiros objetivos da educação. Nas
disciplinas do currículo regular, nas numerosas atividades que
configuram o ano letivo das escolas – semanas culturais, passeios,
projetos e estudos do meio –, é necessário que os educadores propiciem
aos aprendizes a consciência do que é o bem, o bom e o belo. Até porque
essa tríade, capaz de dotar o espírito e a mente humana do viço e da
energia essenciais à edificação de ideais nobres, cria um círculo
virtuoso fundamental à convivência social pacífica, ao desenvolvimento
do caráter ético e ao fortalecimento de valores como honestidade,
lealdade, respeito, solidariedade e senso de justiça.
Essas e tantas outras percepções provêm do aprendizado adquirido na
família e das influências recebidas pelo meio. E é aí que entra o
trabalho sensível dos educadores, cuja missão é ensinar os aprendizes a
lerem as partituras da vida, equilibrando razão e emoção, competência
técnica e amor.
Em seus versos irretocáveis, Manuel Bandeira sintetiza parte dos
conceitos filosóficos descritos por Platão a respeito do belo, tanto em
seu texto Fedro quanto em República. No primeiro, o
filósofo nos diz: “(…) na beleza e no amor que ela suscita, o homem
encontra o ponto de partida para a recordação ou a contemplação das
substâncias ideais”. Já em República, Platão compara o bem ao
Sol, que dá aos objetos não apenas a possibilidade de serem vistos, mas
também a de serem gerados, de crescerem e de se nutrirem. O pensamento
filosófico e a poesia não oferecem caminhos inequívocos para a
felicidade. Melhor do que isso: apontam caminhos para que possamos ter o
prazer de encontrá-la por nossos próprios esforços.
Assim deve ocorrer também com a educação, cujo compromisso maior
precisa ser o de proporcionar escolhas, além de fornecer aos seres em
formação os instrumentos básicos para suas jornadas pessoais. Mestres e
aprendizes têm de compartilhar a fascinante aventura da troca e da
descoberta, de modo que, juntos, ampliem a capacidade de olhar as
paisagens da vida com os olhos de ver. Carlos Drummond de Andrade –
outro mestre sagrado da poesia – já falava sobre isso em seu belíssimo
poema “A flor e a náusea”, do livro A rosa do povo: “Uma flor
nasceu na rua! (…)/Uma flor ainda desbotada/ilude a polícia, rompe o
asfalto./Façam completo silêncio, paralisem os negócios,/garanto que uma
flor nasceu. (…)/É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o
nojo e o ódio.”
Essa visão privilegiada dos poetas e dos filósofos tem de estar no
cerne das propostas educacionais. É preciso utilizar uma pedagogia que
revele o bom, o bem e o belo em sua essência. No ensaio “Inquietudes na
poesia de Drummond”, da obra Vários escritos, o professor Antonio Candido discorre sobre a “função redentora da poesia”.
No dia a dia das escolas, é necessário encontrar um tempo para
resgatar os dizeres dos grandes visionários, para que possamos nos
educar e educar os demais para olhar o asfalto e, ainda assim, enxergar a
flor.
Fonte: revista Profissão Mestre (por Gabriel Chalita)
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